Edson Gambuggi entrou no curso com 76 anos.
Segundo colega, ele ia a festas e tinha os bolsos sempre cheios de balas.
Com uma simpatia envolvente, os bolsos cheios de
balas para oferecer e indo até às "baladas" da turma, Edson Gambuggi
conquistou os colegas no curso de medicina de uma universidade de São Paulo. No
último dia 7, ele realizou o sonho de se formar médico. Aos 82 anos.
"Foi a consolidação de um objetivo de
quatro, cinco décadas", contou o senhor Gambuggi, em entrevista. Farmacêutico
e advogado por formação, ele chegou a ir à Argentina e à Bolívia para
tentar cursar medicina, "mas sempre havia uma dificuldade pelo
caminho".
Gambuggi também começou o curso em Mogi
das Cruzes, em 1971, mas a distância da família e as obrigações do
emprego público dificultaram as coisas. "Deixei vários trabalhos de renome
para correr atrás da medicina", conta. Foi aos 76 anos que ele soube
da abertura do curso na Uninove, em São Paulo, e decidiu tentar a prova.
"Enfrentei grandes dificuldades, sofri.
A faixa etária nem sempre é condizente com a nossa realidade. Se não fossem os
empurrões da vida, acho que eu não conseguiria." Segundo ele, um dos
maiores problemas foi a mudança da área de estudo. "Estudar humanidades é
diferente. No direito, você pode consultar as leis para argumentar. Na medicina,
não. Você precisa saber mesmo para fazer as provas."
Edson Gambuggi recebeu homenagens e falou durante a cerimônia de colação de
grau, no dia 7 deste mês (Foto: Reprodução/Arquivo pessoal)
Educação e balas nos bolsos
Gambuggi conta que, no primeiro dia de aula, todos
se surpreenderam. "No trote, me chamaram para dar aulas de anatomia",
lembra ele, rindo. "Ninguém acreditava que eu estava lá para estudar,
aos 76 anos."
Um dos amigos mais próximos da turma, o agora
médico Charles Marangoni Sampaio, de 25 anos, conta que a simpatia, a educação
e a persistência do senhor Gambuggi conquistaram todos na faculdade. "Ele
cumprimentava todas as pessoas, é muito educado e sempre tinha os bolsos
cheios de balas para oferecer. Ele falava 'oi', perguntava como você estava e
dizia: 'toma aqui uma bala para adoçar a vida'. Essa era a marca registrada
dele."
Para Charles, ter vivido com Gambuggi foi um
aprendizado além do que ele teve na faculdade. "Ele é muito esforçado. Se
faltou cinco dias nesses seis anos, foi muito. Só deixava de ir quando tinha
algum problema de saúde ou exame para fazer. Nas aulas, ele geralmente ficava
horas a mais para tentar fixar o conteúdo."
Charles Marangoni conta que o
senhor Gambuggi chegou até a ir a baladas e a churrascos com a turma.
"Só não participava dos trotes."
Na cerimônia de colação de grau, Charles
fez uma homenagem a Gambuggi, e contou como imaginou que ele fosse o
presidente da universidade logo que o viu na inauguração do curso:
"Enquanto a direção se apresentava na frente dos alunos, uma pessoa
despertava a atenção por seus cabelos brancos - o que não o deixava passar
despercebido por todos à sua volta. Eu particularmente pensei: 'Deve ser o dono
da Uninove!' Após o término da apresentação, fomos divididos em duas
salas. E ao chegar à sala B me deparei com aquele senhor que continuava a me
intrigar... Arrisquei novamente: 'Como o curso de medicina é novo, pode ser o
Presidente do Cremesp!'
Em seguida, Charles falou com
carinho sobre o 'eterno sonhador' que contagiou a todos com seu carisma, sua
gentileza e sua solidariedade.
Agora, o novo médico Gambuggi disse que
não pretende prestar a prova de residência (curso de especialização para
médico), mas quer fazer mais alguns cursos de capacitação para trabalhar
com pessoas carentes. "Gostaria de dar boa parte do que aprendi à
solidariedade."